Rebecca Mitsuuchi
Os impactos na elaboração do prontuário odontológico
Confira na versão online da Revista Vértice a matéria na íntegra.
Rebecca Mitsuuchi é advogada atuante nas áreas odontológica e médica. Pós-graduada em Gestão Hospitalar e Direito Médico pela Faculdade de Ciências da Saúde IGESP (FASIG). Pós-Graduada em Direito Civil e Processual Civil pela Escola Paulista de Direito (EPD).
Por: Rebecca Mitsuuchi
Foto: Rafael Marton
Oprontuário odontológico é um conjunto de documentos que contém todas as informações relevantes sobre o estado clínico do paciente, sendo um dos principais instrumentos na relação entre o dentista e seus pacientes. Contudo, o seu correto preenchimento ainda é um desafio na atuação de muitos profissionais que não imaginam os impactos que a ausência de tais informações pode provocar.
Neste contexto, é fundamental entender que além de ser um registro clínico detalhado obrigatório, o prontuário representa um documento de valor jurídico, cuja correta elaboração pode prevenir inúmeros conflitos legais e éticos, bem como refletir positivamente na credibilidade da clínica perante os pacientes.
Num cenário atual em que a judicialização da saúde tem se tornado mais recorrente também infelizmente na realidade de muitos dentistas é crucial entender que o preenchimento adequado do prontuário odontológico não é apenas uma mera boa prática profissional, mas um fator determinante para a proteção jurídica da odontologia e para a qualidade no atendimento ao paciente, afetando diretamente na relação dentista e paciente.
A função do prontuário odontológico é reunir todas as informações sobre a saúde do paciente, englobando desde a anamnese e o exame clínico até os procedimentos realizados e as prescrições medicamentosas, de acordo com as normas estabelecidas pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO) que por sua vez ressalta a necessidade de conter dados completos e fidedignos.
Logo, o documento em questão pode ser decisivo em casos de litígios, pois ele reflete a conduta do profissional e sua diligência no tratamento ofertado.
- DIREITO ODONTOLÓGICO

Rebecca Mitsuuchi, advogada.
O prontuário odontológico, na íntegra:
Para garantir a segurança jurídica do cirurgião-dentista, trouxemos os principais documentos que podem compor o prontuário odontológico:
1) Anamnese detalhada: é a primeira conduta a ser realizada e registrada pelo profissional, contendendo informações completas sobre o histórico de saúde do paciente, doenças preexistentes, alergias e medicações em uso, sendo necessária a assinatura do paciente ou do seu responsável legal para certificar a veracidade das informações ali contidas;
2) Ficha clínica: descrição das condições bucais com a evolução do caso de forma cronológica e com a comprovação de ciência do paciente sobre os procedimentos executados com registro fotográfico ou radiográfico, quando aplicável;
3) Plano de tratamento: etapas do tratamento planejado, com os objetivos, riscos e alternativas do tratamento aplicáveis ao caso com anuência do paciente, preferencialmente por escrito;
4) Procedimentos realizados: data, técnica utilizada e materiais empregados em cada intervenção;
5) Exames complementares: radiografias e imagens, modelos em gesso e outros. Quando o paciente arcar com os custos dos exames complementares, terá direito de manter em sua posse os documentos originais, reservando ao cirurgião-dentista o direito de obter suas cópias para arquivos do consultório;
6) Receitas, atestados e recibos: devem ser elaborados de forma legível com a devida identificação do profissional, incluindo o seu número de registro no CRO. Manter cópias desses documentos no prontuário do paciente é uma medida de segurança para o profissional;
7) Contrato de prestação de serviços: o plano de tratamento odontológico proposto, após o diagnóstico e demais procedimentos é o objeto do contrato e deve estar muito bem esclarecido ao paciente, que, na qualidade de consumidor, é vulnerável, ou seja, é considerado a parte mais fraca na relação contratual em relação ao fornecedor do serviço, podendo alegar desconhecimento técnico, jurídico, fático e até mesmo informacional. Com o advento da Lei Geral de Dados Pessoais (LGPD), é de suma importância a assessoria jurídica para confecção de cláusulas acerca dos dados de saúde tratados;
8) Termo de consentimento Livre e Esclarecido: sempre que houver procedimentos invasivos, é fundamental que o paciente esteja ciente dos riscos e autorize a intervenção por escrito. É obrigação do cirurgião-dentista esclarecer adequadamente os propósitos, riscos, custos e as alternativas do tratamento, sob pena de incorrer em infração ética, nos termos do artigo 11, inciso IV, do Código de Ética Odontológica (Resolução CFO-118/2012);
9) Termo de confidencialidade: atesta o dever de sigilo e que somente o paciente ou o seu representante legal terá acesso às informações constantes no prontuário;
10) Termo de autorização para tratamento de menor: consiste no consentimento esclarecido assinado pelos pais ou responsáveis, alegando que receberam as devidas orientações do profissional e que estão cientes das opções de tratamento, ou seja, que estão em total concordância com o plano de tratamento a ser realizado pelo menor.
Após a leitura dos principais elementos do prontuário acima, se faz necessário destacar que o correto preenchimento do prontuário protege o cirurgião-dentista contra-acusações de negligência, imperícia ou imprudência. A ausência de registros detalhados pode ser interpretada desfavoravelmente em uma demanda judicial, comprometendo a defesa do profissional.
A omissão de informações ou o preenchimento inadequado do prontuário pode resultar em sérias consequências para o profissional e a clínica como: processos éticos, civis e penais e a perda de credibilidade.
Em contrapartida, um prontuário bem estruturado proporciona diversos benefícios, tais como: melhoria na continuidade do atendimento. Com informações claras e detalhadas, o profissional pode garantir a continuidade do tratamento, mesmo em casos de afastamento temporário ou troca de profissional; facilidade na auditoria: os planos de saúde frequentemente solicitam auditorias dos tratamentos realizados, e um prontuário completo facilita o processo; prevenção de litígios: um prontuário detalhado e bem preenchido é a melhor forma de evitar demandas judiciais, oferecendo segurança tanto para o profissional quanto para o paciente.
Deste modo, o preenchimento correto do prontuário odontológico vai além de uma simples formalidade burocrática, uma vez que representa um cuidado com o paciente, uma proteção para o cirurgião-dentista e um elemento essencial na gestão de risco da clínica odontológica, sendo que profissionais que mantêm seus registros clínicos de forma precisa e completa tendem a ter uma prática mais segura e eficiente, com menores riscos de complicações legais. Portanto, investir em um sistema de preenchimento adequado, assessoria jurídica e em treinamentos regulares para a equipe é uma medida preventiva que fortalece a credibilidade e a segurança da prática odontológica. ▲
